ECA TAMBÉM É DEVER!
O ECA não é só direito, também é dever, assim a conselheira Lívia Mara Tavares Martins, integrante do Conselho Tutelar de Divinópolis fala um pouco da importância do Estatuto da Criança e do Adolescente. E que o Conselho veio para ser parceiro da escola e garantir os direitos dos mesmos. Nesta visão ela concedeu esta entrevista à Ouvidoria Educacional.
Ouvidoria Educacional: Em quais casos e como a escola pode contatar o Conselho Tutelar?
O Conselho Tutelar é parceiro da escola e age em segunda instância, ou seja, é preciso que a escola cumpra sua função social esgotando seus recursos diante do problema, pois é ela a responsável pelo aluno. O Conselho é um órgão que tem o dever de garantir proteção em qualquer situação de ameaça ou violação aos direitos da criança e do adolescente (agressão física e/ou moral; abandono de qualquer espécie, recusa de atendimento médico, recusa de transporte escolar, abuso sexual, quando for negado um defensor para o adolescente infrator, etc.). Nesses casos a escola deverá acionar o Conselho Tutelar através de um Ofício, em que conste todos os dados pessoais da criança em questão e um relato dos fatos, bem como a explanação dos recursos aplicados pela instituição escolar na busca da solução do problema, anexando a certidão de nascimento da criança ou do adolescente.
Ouvidoria Educacional: E a respeito da indisciplina escolar?
Indisciplina não é caso de encaminhamento ao Conselho Tutelar. Atualmente 50% das situações encaminhadas pelas escolas do município ao Conselho Tutelar são questões de indisciplina. Questões disciplinares são de competência da escola. O que se deve fazer é a elaboração do Regimento Escolar, que deve respeitar a Constituição Federal, o ECA, a LDB e as diretrizes, decretos, resoluções e normas do MEC, e das Secretarias Estadual e Municipal de Educação. Todo o procedimento disciplinar deve estar devidamente previsto no Regimento Escolar, considerando que seu objetivo é a salva-guarda dos direitos do aluno/cidadão (criança, adolescente e adulto) contra atos abusivos/arbitrários da autoridade encarregada da aplicação da sanção disciplinar, que não pode violar os direitos fundamentais expressamente relacionados na Constituição Federal e conferidos a qualquer um de nós, bem como esclarecer os deveres dos alunos e as consequências do não cumprimento dos mesmos. É importante que esse documento seja aprovado junto à comunidade escolar e que todos tenham conhecimento do seu conteúdo.
Ouvidoria Educacional: O que pode acontecer a funcionários públicos que praticam violência física e psicológica contra crianças e adolescentes, o famoso Bullying?
No caso de comprovação de violência física e/ou psicológica contra crianças e adolescentes, praticadas por funcionários públicos, esclarecemos que estes responderão judicialmente por crime de violência, podendo gerar pagamento de indenização por danos morais, sem prejuízo de outras medidas que o juiz julgar necessárias, assim como todo e qualquer adulto que cometa tais atos. Lembrando que a Constituição Federal, garante a todos o direito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa. A ocupação de cargo público não confere a seu detentor privilégio ou prejuízo das medidas previstas no Código Penal e aplicáveis quando da prática de violência contra crianças.
Ouvidoria Educacional: É permitido acionar a Polícia Militar em caso de brigas e violência entre alunos dentro da escola?
Agressões e ameaças são caracterizadas crimes, sendo necessário registro de boletim de ocorrência. Por ter sido cometido por adolescente, a ocorrência será registrada com natureza de “Ato Infracional” e será encaminhada pela Delegacia à Vara da Infância, onde se dará a abertura de um processo judicial para apuração dos fatos e serão tomadas as medidas necessárias e as providências cabíveis em cada caso.
Vale ressaltar que o ECA reforçou a idéia de que as crianças e adolescentes também são sujeitos de direitos como todo cidadão, estando em consonância com a Constituição Federal, que estabelece a igualdade de homens e mulheres, independente de sua idade, em direitos e obrigações. O ECA traz também que crianças e adolescentes também possuem deveres, sendo o primeiro deles o dever de respeitar os direitos de seu próximo (seja ele criança, adolescente ou adulto), que são exatamente iguais aos seus.
Ouvidoria Educacional: A escola pode, no exercício e suas competências, “suspender” ou “expulsar” o aluno?
Como já colocado anteriormente, quando abordamos a questão da elaboração do Regimento Escolar, relembramos que todas as sanções aplicadas aos alunos devem estar previstas neste e devem estar em conformidade com a lei. Entretanto não se admite a aplicação de sanções de suspensão pura e simples da frequência à escola (uma eventual suspensão) ou a expulsão de aluno, devido à caracterização destas medidas como a violação do direito de acesso a educação. É de suma importância, também, a observância do caráter educativo das sanções e medidas tomadas, em detrimento apenas da punição, devido à caracterização do ambiente escolar como de cuidado para com a educação de crianças e adolescentes, seres humanos em condição peculiar de desenvolvimento. Sabe-se que medidas educativas demandam maior atenção e disponibilidade que sanções punitivas, entretanto apresentam maior número de resultados positivos.
É recomendável que as escolas atuem de forma preventiva, desenvolvendo políticas e projetos voltados para as questões sociais e educacionais, valorizando as relações entre direitos e deveres e as noções de cidadania. Pois assim a escola cumpre seu papel educacional levando seus alunos a terem conhecimento de seus direitos e deveres.
Ouvidoria Educacional: O que você sugere para que a escola possa resgatar sua credibilidade e sua autoridade perante os alunos e pais, levando-os a exercer também seus deveres?
Acredito que uma primeira medida seria a construção de um regimento interno sólido, atualizado e dinâmico, de acordo com as particularidades de cada escola, respeitando a Constituição Federal, o ECA e a LDB. É de suma importância que tal regimento seja co-construído pela escola, pelos alunos e pais, pois uma vez que há a participação neste processo, existe também maior responsabilização de todos, quando do seu cumprimento e respeito aquilo que é colocado como norma ou mesmo sanção.
Também é muito importante a coesão entre os gestores principais da escola ( Diretor, Diretor Pedagógico, Vice-diretor, Supervisor) nas aplicações das regras disciplinares, pois se os próprios profissionais da escola não cumprem o que é estabelecido, qual o motivo e como cobrar que os alunos o façam?
E por fim, a parceria com as famílias, pois somente quando as pessoas responsáveis pela educação das crianças e adolescentes estão envolvidos no processo e têm um objetivo comum é que a escola exerce com sucesso seu papel social de promoção da aprendizagem. A escola precisa construir estratégias para cientizar a família do processo educacional do aluno, suas dificuldades e também seus sucessos, para que a família possa também ser cobrada, pois só é co-responsável aquele que tem ciência da situação e quando esta comunicação entre "instituição de ensino/família" falha, a escola, por uma falha institucional, poderá ser transformada em vilã, e então implicará em problemas e dificuldades.
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